Adaptado por Marianna Kunrath Lima 25/06/21
Em dezembro de 2020, quando a variante Delta foi primeiramente descrita na Índia, ela parecia não ser digna de muita atenção. Porém, alguns meses depois, quando a variante chegou a Nova Deli, seu impacto foi devastador, chegando a 30.000 casos novos notificados por dia na Índia em abril.
De Nova Deli, a variante rapidamente se espalhou, devido à sua maior transmissibilidade e possível maior evasão do sistema imune. Tudo indica que a variante Delta logo se espalhará globalmente, levando a uma terceira onda devastadora. No Reino Unido, mais de 90% das novas infecções correspondem à variante Delta, o que fez o governo adiar a fase final de reabertura do país. Em Portugal, o surgimento da variante Delta em Lisboa gerou um fechamento, com duração de três dias, da cidade, ninguém podia sair ou entrar em Lisboa. Tudo indica que esta variante também está causando surtos na Rússia, Indonésia e em outros países. Nos EUA a variante foi considerada de preocupação no dia 15 de junho (para saber o que é uma variante de preocupação leia nosso artigo – SARS-CoV-2: O que sabemos sobre as variantes?).
Estes surtos causaram um frenesi entre os pesquisadores para tentar compreender porque a variante Delta parece se espalhar muito mais rápido do que as outras três variantes de preocupação, além de entender se ela pode ser mais perigosa em outras maneiras e como seu conjunto de mutações pode causar estragos. A chegada da Delta também trouxe atenção para o potencial do SARS-CoV-2 de evoluir e se adaptar nos próximos meses e anos.
Estudos feitos na Inglaterra estimaram que a variante Delta pode ter uma capacidade de transmissão de 50% a 100% maior do que a variante Alfa. Alguns cientistas defendem que a proteção reduzida das vacinas também pode desempenhar um papel na maior transmissibilidade. Dados da Inglaterra e da Escócia indicam que as vacinas Pfizer-BioNTech e AstraZeneca oferecem proteção ligeiramente menor contra infecções sintomáticas da nova variante do que da Alfa. Pessoas que receberam apenas uma dose de vacina – como muitos residentes do Reino Unido receberam – são especialmente vulneráveis (duas doses de ambas as vacinas ainda oferecem o mesmo nível de alta proteção contra hospitalização em infectados pela Delta). Não está claro como as muitas outras vacinas agora em uso ao redor do mundo protegem contra a variante Delta, e há poucos dados sobre a proteção resultante de um histórico anterior de infecção por COVID-19. No momento, a Delta é uma ameaça especial para os países mais pobres, com pouco ou nenhum acesso às vacinas.
Os pesquisadores apenas começaram a investigar o que torna a Delta tão perigosa. Eles estão se concentrando em um conjunto de nove mutações no gene que codifica a proteína Spike, que atravessa a superfície do vírus e permite que ele invada células humanas. Uma mutação importante é a P681R que modifica um aminoácido em um ponto diretamente ao lado do local de clivagem da furina, onde uma enzima humana corta a proteína, um passo fundamental para que o vírus invada células humanas. Na variante Alfa, uma mutação neste local tornou a clivagem mais eficiente; um preprint publicado no final de maio mostrou que as diferentes mudanças da Delta tornam a clivagem da furina ainda mais fácil. Os cientistas sugerem que isso pode tornar o vírus mais transmissível. Porém, estudos japoneses com pseudovírus contendo a mutação P681R mostraram que esta não aumentou a infectividade in vitro, e outras variantes existentes na Índia, que possuem a mesma mutação, não se propagaram tão bem como a Delta.
Embora os pesquisadores possam não concordar sobre os motivos que levam a variante Delta a ser mais transmissível, todos concordam que uma ação urgente é necessária para impedir a disseminação da nova variante. Aumentar os esforços de vacinação e aumentar o número de vacinas para lugares onde a Delta está aumentando é essencial. Em 18 de junho, o presidente dos EUA, Joe Biden, pediu aos jovens que se vacinassem totalmente para se protegerem da Delta. Países com pouco acesso à vacina precisam recorrer novamente a intervenções como distanciamento físico e máscaras (o Brasil se inclui neste caso). O objetivo não é apenas salvar vidas imediatamente, mas também dar ao vírus menos espaço para evoluir ainda mais. O sucesso da Delta mostrou que os cientistas não são capazes de identificar novas variantes perigosas a tempo de impedir sua disseminação, apesar de um esforço global sem precedentes para rastrear sua evolução em tempo real.
Adaptado de:
Kai Kupferschmidt, Meredith Wadman. Delta variant triggers new phase in the pandemic. Science 25 Jun 2021: Vol. 372, Issue 6549, pp. 1375-1376. DOI: 10.1126/science.372.6549.1375.